
Dezembro de 1992. O presidente da República, Fernando Collor de Mello, sofreu impeachment e foi removido da presidência pelo Congresso. Ficou inelegível por oito anos.
Motivo: indícios de corrupção.
O processo teve início a partir de uma entrevista de seu irmão Pedro Collor de Mello a revista Veja, onde Pedro acusava o próprio irmão e Paulo Cesar Farias de agirem em conluio para obter recursos financeiros de empresas privadas. O auge do escândalo foi a revelação através do motorista, que uma camioneta Fiat Elba registrada em nome de Color, havia sido comprada com um cheque de PC Farias.
Cabe lembrar que ninguém reclamou da revista.
Para que se desencadeie um processo de impeachment, é necessária apenas a suspeita da prática de um crime ou de uma conduta inadequada para o cargo.
No último sábado, seis dias após as eleições, aconteceram em várias capitais brasileiras atos públicos, passeatas e manifestações pedindo o impeachment de Dilma.
Tais atos foram ridicularizados por setores da imprensa. Taxados por alguns de “golpismo” ou “bobagem”. Os manifestantes, taxados de “fascistas”, pelos adeptos da presidente reeleita.
Com amplo domínio político, partidário e financeiro no Congresso, é difícil êxito em um processo de impeachment contra a atual presidente. Mas, de acordo com a Legislação vigente, seria admissível um processo de impeachment. Existe um precedente e motivo. Talvez até três, pelo menos.
Para quem tem memória curta, cabe lembrar que o atual escândalo da Petrobrás teve seu pontapé inicial quando a própria Presidência da República, antecipando-se ao furacão que viria a seguir, soltou uma nota oficial, confirmando que Dilma, quando presidia o conselhão da empresa, aprovou a compra superfaturada da refinaria de Pasadena , com a questionável ressalva de ter sido mal assessorada sobre o assunto. Lula, mais acostumado ao safar-se no olho dos furacões, chegou a classificar a nota como “um tiro no pé”.
Posteriormente vieram as delações premiadas do ex diretor Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef e muitos detalhes escabrosos das maracutaias acontecidas na maior estatal brasileira. Muito mais malcheirosas até, do que a refinaria de Pasadena.
Alberto Youssef, em seu depoimento no processo de Delação Premiada afirmou que o “Planalto” teria conhecimento, nas pessoas de “Lula e Dilma”, dos “malfeitos” na Petrobrás. A informação foi objeto de ampla divulgação na revista Veja. Ora, por analogia ao caso Collor, motivação mais do que justa e legal para abertura de um processo de impeachment.
Um segundo motivo, este muito mais forte, óbvio e palpável para abertura de um processo de impeachment é a inobservância clara, flagrante e inequívoca, por parte da presidente Dilma Rousseff, do disposto no artigo 49, Ítem 1 da Constituição Brasileira.
O Art. 49 diz claramente: “É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
I – resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;”
Pronto. Pergunte a qualquer jurista ou advogado e ele confirmará: presidente da República, de acordo com o Artigo 49 da CF, NÃO PODE financiar, emprestar ou doar dinheiro dos brasileiros a países estrangeiros sem a anuência do Congresso Nacional. A desculpa esfarrapada de que o financiamento do Porto de Mariel em Cuba – fato: com dinheiro dos brasileiros – deu-se através de financiamento à construtora que realizou a obra, é tão estapafúrdia, quanto a outra absurda novidade no obscuro negócio: foi decretado “sigilo” dos contratos do empréstimo ilegal. Nada se sabe sobre o negócio. Taxas de juros, valores, carência, garantias, prazo, NADA!
Outro artigo da Constituição Federal que está sendo violado ainda: é o de número 37, que define os princípios da Administração Pública, aos quais TODOS os agentes públicos estão subordinados, inclusive a Presidente e o banco estatal BNDES: são os princípios “Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência”. Pois esse sigilo não é LEGAL e obviamente desrespeitou o princípio da PUBLICIDADE. A tão decantada transparência que deve, por força de lei, nortear os negócios públicos.
As ilegalidades flagrantes cometidas no caso dos empréstimos a países estrangeiros são inclusive motivo mais do que suficiente também para uma ADIN – Ação Direta de Inconstitucionalidade – no STF – Supremo Tribunal Federal – a instância máxima da Justiça brasileira, a quem cabe julgar o Presidente da República.
Uma ADIN é cabível frente a inobservância por parte do Presidente da República da Constituição vigente.
No caso específico dos empréstimos aos países estrangeiros, somente as seguintes pessoas ou entidades podem propor a ADIN: Mesa do Senado Federal; Mesa da Câmara dos Deputados; Procurador-Geral da República; Conselho Federal da OAB; Partido político com representação no Congresso Nacional; Confederação sindical ou entidade de classe no âmbito nacional.
Nós, cidadãos comuns, infelizmente, não podemos.
Desde fevereiro de 2014 tramita no STF um mandado de segurança movido pelo senador Álvaro Dias (PSDB-PR) para receber informações sobre os empréstimos feitos pelo BNDES aos governos cubano e angolano. Antes de recorrer ao STF, já haviam sido pedidos os esclarecimentos por vias administrativas, os quais foram negados sob a alegação de sigilo imposto pelos governos daqueles países. Desculpa absurda e inaceitável essa de submeter a Constituição Brasileira à imposição de outros países. Um disparate. A matéria no STF está para ser relatada pelo Ministro Luiz Fux.
Aguarda-se a manifestação, quem sabe, para breve.
A conclusão óbvia é que NÃO são infundados os motivos que poderiam SIM levar a atual presidente a sofrer um processo de impeachment. Se este seria vitorioso ou não, é outra questão. Motivação legal existe. Claramente.
Esse assunto vai longe.
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